terça-feira, novembro 22, 2005

Pierrot

Um pierrot. O fato largo não permite descobrir as formas, e no entanto sei que é feminino. (Um narrador sabe estas coisas) Veste-se de amarelo claro, uma cor pastel, daquelas que não saltam à vista. Tem um rosto excessivamente maquilhado. Vermelho sangue nos lábios, preto marcando o contorno dos olhos, branco impedindo o rubor das faces. No momento, tem a imobilidade de uma estátua. Sentado no chão, meio curvado, olha em frente. Vê o entardecer através da parede envidraçada do chão ao tecto que tem perante si. É uma sala sem portas ou outro tipo de entrada. A luz que se escoa lentamente advém daquela grande janela. Está a entardecer. Areia e céu. Mas ouve-se o som do mar, enquanto o sol desce no horizonte. Laranja azulado.
Treme um lábio, imperceptível. Uns braços esqueléticos apertam só um pouco mais os joelhos de encontro ao peito. Um pescoço pende de tão exausto e solta-se um soluço de criança. Vira o corpo uns graus e fica de gatas. Arrasta-se com esforço. Só uns metros a afastam da parede. Uma distância facilmente encurtada por poucos passos. Um braço escapa-se, uma perna que prende, uma respiração que palpita, tão rápida, gestos que demoram a pronunciar-se. Já é noite e as estrelas brilham quando uma mão aflora o vidro feito da escuridão crescente. Esmaga a superfície com todo o peso do seu corpo e a mão escorrega, esborratando o que vê. Vira a palma da mão que está manchada, olha a mistura de azul escuro e branco na tela. Uns olhos aumentam de repente. E enquanto um grito animal ecoa no mundo, uma mulher de cabelos castanhos que ondulam ao vento olha a cena de fora da parede envidraçada. Docemente toca com um dedo a parede enquanto lágrimas deslizam suavemente afogado os olhos e molhando a aba do seu vestido branco. Lá dentro, um ser morre no sufoco do desespero, enquanto o seu corpo envolto por epilépticos movimentos, tomba, deixando entrever por entre o chapéu que saí, um longo cabelo castanho ondulado que vai perdendo a vida.

Espiral

Dualitaate

terça-feira, novembro 08, 2005

Cera

Sem luz
Acenderia sete velas
Faria amor,
quente!
Morria, a seguir.
Não quero mais o peso do após.
O cheiro da cera a queimar,fere
O corpo de fumo evapora,
sem me alimentar
Imploro pela infinita escuridão.

Cavalo Branco

Dualitate

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